domingo, 27 de julho de 2008

Mais que tudo em Londres (Parte 1)

Dez euros em moedas tilintavam na algibeira de Jorge Macieira. Dez euros e não mais de três libras que sobravam da sua recente viagem a Londres, onde conhecera a bela Celine no West Cromwell Hotel, em West Cromwell Road, perto de Earl’s Court. Chegara agora a Caldas da Rainha. O homem que, na camioneta vinda de Lisboa, vinha ao lado de Jorge, ocupava mais do que o seu próprio lugar e Jorge Macieira estava convencido que havia sido o repolhudo homem a roubar-lhe a carteira, deixando-o sem documentos, ficando apenas com os dez euros em moedas e as parcas libras ainda não trocadas.

Encontrou-se com o seu amigo Duarte Fernandes no Café Rosa, na Rainha. Sentaram-se numa mesa que ainda não havia sido limpa, com dois pratos e uma chávena de café por levantar. Veio a empregada e, depois de esta limpar a mesa, infantilmente, Jorge, de trinta e um anos, pediu uma Coca-Cola e um Bolicao.
- Esse bolo, entre aspas, é repugnante, sabes?
- Não, pá, é bom. Então mas eu volto de Londres e tu falas-me do bolo?
- É tudo de plástico, uma coisa nojenta. – dizia Duarte, que havia pedido apenas um café curto.
- Mau! Então pergunta lá, “Como é que foi Londres?”
- Sim, como foi?
- Vou-me casar.
- O quê? Estás a gozar?
- Não, conheci lá uma rapariga.
- E vais-te casar? Estás lá uma semana, conheces mal uma rapariga e vais-te casar?
- Sim, decidimos. E a minha mãe também me andava a chatear…
- Isso é completamente ridículo! A tua mãe não tem nada de interferir nessas coisas e ainda por cima tu vais na conversa dela? – ralhou Duarte.
- Mas eu gosto dela mesmo, ó Duarte. Chiça, mas nem me dás os parabéns? Bem tenho cá um amigo!
- Sim, parabéns, então. Mas pronto, também se é isso que tu queres…
- Sim, contigo é que não queria casar, sabes.
- Lá vem a piada do costume.

***

Celine desceu as escadas estreitas forradas a alcatifa azul para se dirigir à sala onde era servido o pequeno-almoço. Nessa sala apenas estava Jorge Macieira, português permanentemente agarrado ao telemóvel. Celine largou, ao entrar, um “good morning”.
- Bom dia… aliás… good morning. – respondeu, atrapalhado com a beleza da americana, metida dentro de um vestido preto e que realçava as suas curvas. Ela riu-se com a confusão linguística de Jorge Macieira. Quando os dois se levantaram para ir buscar mais sumo de laranja à mesa encostada à parede da minúscula sala de pequenos-almoços, o português meteu conversa com a ianque:
- Então, é de cá? – indagou em inglês.
- Não, sou de DC.
- Washington?
- Sim, Washington DC. O senhor é que não é, pois não?
- Não, sou de Portugal. – esclareceu sorridente.
-Oh, Portugal. Cristiano Ronaldo!
- Tinha de ser. – desabafou em português.
- Desculpe?
- Não, nada. É que sempre que falamos em Portugal, fala-se do Cristiano Ronaldo e do futebol.
- Pois, se calhar. Mas já foi à Tate Modern.
- Não, por acaso, não.
- Nem eu. Tem planos muito definidos para hoje ou gostaria de me acompanhar?
- Não… ah… claro, está pensar em ir a que horas?
- Ia já, por acaso.

Continua...

2 comentários:

Luís Sá Lopes disse...

Só temos um adjectivo :
Óptimo
Melros

Jorge Macieira disse...

O Cardoso escreve bem. Deixa-me alguma esperança na geração mais nova. Fico, contudo, curioso quanto à minha influência inspiradora ...